sábado, 8 de julho de 2023
Solidão
terça-feira, 4 de julho de 2023
Ela partiu
Há
muito tempo ela chegou na minha casa, novinha, cheirosa, linda, confesso que
foi amor à primeira vista, ainda mais quando se propunha a fazer a parte mais
cansativa da casa.
Minha
nova secretária era perfeita, fazia tudo com muito esmero, e eu fui assim me
apaixonando, a cada serviço eu ficava mais agradecida, depois eu vi que não era
só gratidão, minha secretária era perfeita, a melhor que uma dona de casa pode
ter, sempre limpinha, não importa suas curvas, que para falar verdade, foi bem
desenhada, era o máximo.
Passávamos
horas e horas eu e ela, ela e eu. Eu precisava de seus cuidados e ela estava
ali, sempre pronta, mas ultimamente vinha dando sinais de insatisfação, cansaço
já não mantínhamos mais a mesma conexão, não da minha parte, por vezes nos
desentendíamos. Seus afazeres estavam deixando a desejar, tentei um carinho, dei
um melhor cantinho, porém, não surtiu efeito algum, emburrada não queria conversa.
Devo reconhecer que tenha sido negligente, talvez precisasse de cuidados mais
especiais, mais carinho, porém ontem, foi a gota d’água: ela me revelou que já
não aguentava mais essa e partiu me deixando na maior tristeza.
Agora
entendo Belchior e a relação dele com sua “madame Frigidaire”. Pois é, hoje me
vi tão sozinha vendo aquela porção de roupas jogadas esperando outra a me
ajudar.
Minha
máquina de lavar roupas Eletrolux partiu, me deixou partindo me coração, meus
braços mais ainda doloridos.
Não
sabe ela, que foi um dos melhores presentes que ganhei nos últimos anos
Vá
em paz minha máquina Eletrolux.
Socorro Oliveira
quarta-feira, 22 de fevereiro de 2023
Café amargo.
Nem
sempre os olhos refletem a alma, com o tempo aprendemos a controlar os
sentimentos, não deixar transparecer o que vem na mente no momento, assim como
o corpo nem sempre demonstra as dores que se sente.
Venha,
sente, vamos bater um papo de alma, não se preocupe minha consciência é um baú
de chaves secretas, enferrujadas por causa das intempéries da vida, tomemos um
café, o meu é forte e amargo, - minha tia costuma dizer que de amargo já basta
a vida - não se sinta constrangido de não gostar do sabor amargo, assim como o
café temos nossas amarguras e frustações.
Não
se envergonhe de largar o fardo que te corcova, que te faz lagrimejar, eu também choro de vez enquanto, quando as
barreiras criadas não suportam o desague, não gostou do café mesmo adoçado? Te
faço um chá, sou boa anfitriã gosto de fazer a pessoa se sentir à vontade, como
se estivesse no seu habitar.
Sim, a vida está bem mais difícil. Porém, isso
não lhe dá o direito de ser tão amargo, deixe isso para meu café, o sol lá fora
parece não amenizar a frieza dentro de você, eu sei, não precisa me dizer, um
espirito de luz falou que tudo passa, isso também vai passar.
Quer almoçar comigo? Vou fazer uma torta, minha
especialidade, todos gostam, ou fingem gostar, eles são como os pensamentos,
uns agradáveis outros não, posso servir um suco de maracujá, acalma os nervos, dizem
que nos faz dormir.
Ontem, estives-te presente em meus pensamentos:
lembrei-me de dias inocentes de nossa infância lá no bairro Alto da Conceição,
em Mossoró, de quando corríamos descalços, eu só de calcinha e você meu irmão
Eguismar, com suas traquinagens, às vezes tirava o calção e saía nu com ele na
cabeça, lembra? A calçada era nosso parque, as brincadeiras nos deixavam
cansados sem pensar na vida que iriamos ter, só vivíamos e assim adormecíamos
felizes.
Precisamos nos ver com frequência. Um pouco mais
de café?
21/11/2022
Socorro Oliveira
domingo, 19 de fevereiro de 2023
✍️Envelhecer
Sua bênção, minha velha!
Esta semana fui agraciada com as presenças de pessoas que já partiram. Fernando, pai de @segundo_tattoo meu filho, foi o primeiro. Adormecia e lá estava ele me falando em documentos, não se fazia entender ou a minha mediunidade não me deixou ver nas entrelinhas, acreditei que estava precisando conversar mais com Jesus, mas o cansaço me desfalecia, e outra vez ele voltava a mostrar os tais papéis. O dia amanheceu, eu tentando entender.
Quinta-feira recebi a visita de Lúcio, meu irmão. Também tinha algo a dizer, porém nunca chegava a finalizar, também não entendi a mensagem, minha mãe me veio à memória, com sua vida sofrida nos seus 70 e poucos anos sem nunca ter o sossego devido.
Depois que ela partiu, além das recordações, resta-me fragmentos dela em mim, do que viveu, do que cultivou e me passou. Algumas coisas parecem retrógadas, no entanto, no tempo dela não era, me esforço para não cometer os mesmos erros, vou aprendendo a lidar com a vida, busco deixar outros fragmentos em quem comigo convive.
Nos seus últimos momentos, antes de partir, foram tão significativos, tão sofridos e trouxeram confirmações e convicções que carrego comigo: como existências de vidas passadas. Nos últimos minutos de sua vida falava o nome de cada um que dizia estava chegando - seus amigos e parentes que estavam do outro lado - não tive o privilégio de vê-los, entretanto pressenti sentir o perfume de meu pai, sou grata a todos que estiveram naquele momento ajudando-a na passagem.
Aprendi que a fragilidade dos segundos não me refuta a dizer o quanto amo, o abraço que necessito, pois segundos depois posso não ter essa oportunidade, então, procrastinar para quê? Amanhã pode não existir.
Tenho tantas recordações dela, heranças genéticas ou não, que no meu envelhecer vou percebendo. Não faço listinhas de compras, não sou boa de matemática, fazendo a feira sei exatamente quanto vou pagar no caixa sem calculadora, são tantos predicados que não conseguiria pôr aqui. A verdade mamãe, é sua falta se faz em pequenas coisas e sua presença em mim se confirma na saudade latente que muitas vezes bate a porta, sinto no seu cheiro, seu sorriso, em suas mãos de unhas bem feitas, nesse momento me lembro delas frias, tão roxinhas entrelaçadas naquele último momento do qual coloquei meu terço para te acompanhar.
Sua bênção, minha velha.